Olimpíadas: conheça a época em que as artes também…

Olimpíadas: conheça a época em que as artes também…


A cerimônia de abertura do Olimpíadas de Paris acontece nesta sexta-feira, 26, e, nas próximas duas semanas, homens e mulheres com corpos esculturais e habilidades quase sobre-humanas duelarão pelas cobiçadas medalhas dos jogos. No entanto, nem sempre foram os únicos merecedores do prémio: há algumas décadas, era possível assistir ao torneio para ver arquitetos, músicos, escultores, escritores e pintores ganharem algumas das 151 medalhas atribuídas a artistas olímpicos entre 1912 e 1948.

Embora pareça estranho, e totalmente obscuro, essa fase realmente existiu, mas não teve muito impacto nas artes ou nos Jogos Olímpicos: as medalhas concedidas a essas atividades foram até desconsideradas e não fazem mais parte da contagem oficial dos países. Os detalhes que se conhecem estão espalhados em estudos específicos ou condensados ​​no livro As esquecidas competições de arte olímpicade Richard Stanton, um dos únicos existentes sobre o assunto.

Medalhas Olímpicas concedidas a artistas entre 1912 e 1948 (Museu Olímpico de Lausanne/Revista Smithsonian/Reprodução)

O início das competições artísticas

Na obra, Stanton diz que tudo começou com uma figura conhecida na história das Olimpíadas: o Barão Pierre de Coubertin, um dos fundadores do Comitê Olímpico Internacional, criado em 1894. Dois anos depois, em Atenas, o aconteceria a primeira edição das Olimpíadas modernas, mas a arte, como hoje, não fazia parte das competições oficiais. Foi assim até 1906, quando Coubertin propôs que os jogos também tivessem uma dimensão artística.

“Ele partiu do pressuposto de que os Jogos Olímpicos deveriam ser inspirados na concepção grega clássica de Olimpismo, em que corpo, mente e intelecto não podem ser separados”, explicou a historiadora Juliana Carneiro, que estudou as Olimpíadas em seu doutorado. A ideia enfrentou resistências, e só foi tirada do papel nos jogos de Estocolmo, em 1912, quando foram inauguradas as cinco modalidades artísticas do “pentatlo das musas”: pintura, escultura, literatura, arquitetura e música.

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Escultura de Wanter Winan, um dos primeiros a ganhar medalha em competições artísticas nas Olimpíadas de 1912 (Museu Olímpico de Lausanne/Revista Smithsonian/Reprodução)

Como eram as competições por medalhas artísticas?

A lógica era a mesma das competições esportivas: os artistas apresentavam seus trabalhos, que deveriam ser inéditos, e eram avaliados por uma série de jurados, que atribuíam notas a cada um deles, distribuindo medalhas ao final. Seguindo o modelo da antiguidade clássica, apenas amadores podiam competir, e o trabalho precisava estar relacionado ao esporte.

Essas características limitaram o número de participantes e a diversidade da premiação – muitas das obras arquitetônicas, por exemplo, eram projetos de estádios e arenas pensados ​​para os próprios jogos, e as músicas soavam mais como hinos do que como sinfonias. As edições seguintes também impuseram um limite máximo de 20 mil palavras para obras literárias e uma hora para produções musicais, de forma a dar aos jurados tempo suficiente para avaliar todos os concorrentes.

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Payne Whitney Gymnasium, de John Russell Pope, que venceu a competição olímpica de arquitetura (Parceria Designe de Preservação/Reprodução)

Na edição de 1932, em Los Angeles, cerca de 400 mil pessoas visitaram a exposição dos concorrentes no Museu de História, Ciência e Artes. Naquele ano, John Russell Pope, arquiteto responsável pelo Jefferson Memorial em Washington, ganhou uma medalha de ouro pelo projeto do Payne Whitney Gymnasium, construído na Universidade de Yale. O escultor italiano Rembrandt Bugatti, o ilustrador americano Percy Crosby, o autor irlandês Oliver St. John Gogarty e o pintor holandês Isaac Israels são outros participantes que também receberam uma medalha olímpica de artes. Mas quem se lembra deles hoje?

Um fato curioso é que o próprio Barão de Coubertin foi um dos vencedores. Aparentemente, ele temia que não houvesse competidores suficientes na primeira edição dos Jogos, o que frustraria sua ideia de integrar as artes à competição. Por isso, inscreveu um poema de sua autoria sob os pseudônimos de George Hohrod e Martin Eschbach, ganhando o ouro em 1912. Outra figura ilustre que venceu as artes no concurso foi o francês Paul Landowski, um dos escultores do Cristo Redentor — ele levou ouro com a escultura de um boxeador nos jogos de 1928 em Amsterdã. A maioria dos vencedores, no entanto, são hoje completamente desconhecidos e não tiveram impacto nas artes ou nas Olimpíadas.

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Pintura de Jean Jacob, vencedor das Olimpíadas de 1928 (Museu Olímpico de Lausanne/Revista Smithsonian/Reprodução)

Alemanha nazista e medalhas olímpicas artísticas

Uma das competições artísticas mais emblemáticas, porém, aconteceu nos Jogos de Berlim, em 1936. Sob o governo de Hitler, a Alemanha aproveitou o poder simbólico dos Jogos e decidiu transmitir ao mundo uma imagem ligada à Grécia Antiga, na era nazista. tentativa de reforçar a superioridade ariana. Naquele ano, a Áustria e a Alemanha dominaram a competição nas artes: a Áustria levou para casa o ouro e o bronze na arquitetura, e deixou a prata para a Alemanha, que levou o ouro nas três categorias musicais, escrita lírica, escultura em relevo e em duas das os três prémios de urbanismo, entre outros – importa referir, no entanto, que os jurados eram maioritariamente alemães, o que lançou suspeitas sobre o concurso.

O que acabou com as competições artísticas nas Olimpíadas?

Nos anos seguintes, duas edições das Olimpíadas foram canceladas devido à Segunda Guerra Mundial, que assolou a Europa até 1945. Com a volta dos jogos em 1948, a qualidade questionável das obras e o avanço do esporte fizeram com que a população perder o apreço pelas competições artísticas. “O COI reclamou de gastar dinheiro e planejar uma superlogística, quase ninguém se interessando por essas competições”, explicou Juliana Carneiro. Chegou-se a tentar autorizar profissionais para resolver o problema de qualidade, mas o órgão acabou decidindo que as artes não teriam mais lugar nas Olimpíadas.

Hoje em dia, a cultura nas Olimpíadas está muito mais relacionada a cerimônias e programas que podem se estender por todo o período pré-olímpico. A arquitetura e o seu simbolismo também continuam a desempenhar um papel importante na transmissão de uma imagem específica do país ao mundo. Quanto às medalhas artísticas, uma das últimas conhecidas foi uma prata para o britânico John Copley, em 1948, por representação de jogadores de pólo. Na época, ele tinha 73 anos e, se ainda fossem contabilizadas as medalhas, seria considerado o medalhista olímpico mais velho da história.



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