O ministro Dias Toffoli esclareceu seu voto e o STF formou maioria para descriminalizar o uso pessoal da maconha.
A decisão do Supremo Tribunal Federal é necessária e positiva, mas insuficiente. E é precário.
É necessário porque a lei é omissa. O Congresso criou uma lei que diz que tráfico e uso pessoal são coisas diferentes, mas não diz qual é a diferença. O resultado prático é que a lei não é a mesma para todos: enquanto brancos e ricos são classificados como usuários e vão para casa, negros e pobres são classificados como traficantes e vão para a cadeia.
O Congresso evita o assunto desde que a lei foi criada em 2006, então coube ao Supremo Tribunal Federal — que tem a obrigação de garantir que todos sejam iguais perante a lei — estabelecer a diferença. Não há invasão de jurisdição e o Congresso tem o poder de criar um critério diferente.
A decisão é positiva porque evita o absurdo de mandar para a cadeia um grande número de jovens que não fizeram mal a ninguém. E porque impede que esses jovens ingressem em facções criminosas (algo obrigatório no inferno carcerário brasileiro).
Mas é insuficiente por vários motivos:
O estatuto jurídico da marijuana continua absurdo: é permitido comprar (em pequenas quantidades), mas é proibido vender.
Os produtos terapêuticos derivados da Cannabis continuarão a ser restritos e caros.
O Brasil continua incapaz de aproveitar as muitas oportunidades econômicas que a exploração da Cannabis traz.
Outras drogas além da maconha continuarão a receber o mesmo tratamento de sempre. A dependência dessas drogas continuará a ser tratada como caso de polícia e não como problema de saúde pública.
O tráfico de drogas, seja maconha ou qualquer outra coisa, continuará recebendo o mesmo tratamento. Ou seja, a política de Guerra às Drogas — que demonstrou não só que não funciona, mas também que aumenta o problema da violência — continuará a existir e será responsável pela morte de inúmeros criminosos, pessoas inocentes e agentes policiais. .
E é precário porque a qualquer momento o Congresso pode voltar ao assunto e “esclarecer” o assunto para pior. O projeto que criminaliza a posse e posse de entorpecentes em qualquer quantidade já foi aprovado no Senado e aguarda apreciação na Câmara (depois do desgaste e vergonha que foi o Projeto do Estuprador, não se sabe se ou quando Arthur Lira irá apresentar para votar).
O fato é que ainda há necessidade de um debate amplo e sério sobre drogas no Brasil. Infelizmente, nossos parlamentares estão menos interessados em debater do que em gritar, xingar e lacrar.
(Por Ricardo Rangel em 28/06/2024)
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