Mediador da ONU no Oriente Médio reflete sobre os desdobramentos da guerra em Gaza

O Coordenador Especial da ONU para o Processo de Paz no Médio Oriente, Tor Wennesland, descreveu a situação entre israelitas e palestinianos como uma crise sem precedentes que ameaça moldar gerações e desestabilizar a região.

Em entrevista exclusiva à ONU News, Wennesland compartilhou reflexões sobre sua experiência no cargo, os desafios atuais e o que acredita ser necessário para buscar a paz.

“O maior teste de estresse da ONU”

Wennesland classificou a crise que se desenrola desde 7 de outubro de 2023 como uma “avalanche” que pegou a todos de surpresa, desde as partes envolvidas no conflito até os atores regionais e a própria ONU.

Ele destacou que a situação representa o “maior teste de estresse” enfrentado pela organização em relação ao conflito israelo-palestiniano. O coordenador especial considera que “chegou-se a um ponto em que a diplomacia falhou, no meio de uma situação geopolítica extremamente difícil”, notando que o impacto se faz sentir tanto em Gaza como na Cisjordânia.

O diplomata avalia que isso se refletiu no trabalho do Conselho de Segurança e coloca grandes restrições às Nações Unidas e à capacidade da organização de realizar ações no terreno. No entanto, lembrou que o órgão sempre teve uma posição unificada na defesa da solução dos dois Estados.

Ameaça ao futuro Estado palestino

Wennesland alertou para as forças que estão a trabalhar para desmantelar as estruturas institucionais necessárias para um futuro Estado palestiniano, “com uma velocidade e um ímpeto nunca antes vistos”. Para ele, “estão se perdendo os parâmetros que nortearam esse processo desde 1967”.

O coordenador especial destacou a rapidez com que as capacidades palestinianas estão a ser minadas, deixando a população em condições de extrema vulnerabilidade. Segundo ele, “Gaza é um pesadelo absoluto e é assustador ver a exposição da população ao que está acontecendo”.

O diplomata acrescentou que existe “um factor de medo que está claramente presente na Cisjordânia”, devido a este colapso das estruturas institucionais.

Comentando que a população palestina é composta especialmente por jovens, Wennesland destacou a sua preocupação com esta geração que, “sem perspectivas de soluções, pode procurar saídas para a sua frustração que serão perigosas para todos”.

“Todo o sistema está desequilibrado”

Para ele, “Israel também está desmoronando”, com a economia em queda e tensões internas. Por isso, o diplomata conclui que “todo o sistema, tanto na Palestina como em Israel, está desequilibrado e para redefini-lo será necessário muito esforço”.

Wennesland enfatizou que a comunidade internacional deve assumir um papel de liderança, “aderindo aos princípios internacionais e ao direito internacional sem compromisso”. Caso contrário, este precedente poderia ser usado negativamente em outros lugares.

O coordenador especial explicou que mantém um diálogo muito próximo com os países da região, pois “são eles que mais têm a ganhar com uma situação de estabilidade regional”.

Enfatizou também a importância de um cessar-fogo imediato como primeiro passo para criar condições para futuras negociações. O diplomata disse que é necessário garantir a segurança tanto para os palestinianos como para os israelitas, lembrando que o impacto do conflito transcende fronteiras e afecta comunidades em todo o mundo.

O Coordenador Especial da ONU para o Processo de Paz no Oriente Médio, Tor Wennesland, durante entrevista ao UN News

Diplomacia e paciência

Ao refletir sobre a complexidade da mediação do conflito, Wennesland sublinhou que “a diplomacia exige paciência”, mas que o momento das decisões diplomáticas se aproxima.

Sem entrar em detalhes, disse que é preciso aproveitar esta oportunidade de forma inteligente e rápida, para evitar o risco de ela escapar pelas mãos.

Prestes a deixar o cargo, Wennesland apelou aos israelitas e aos palestinianos para que procurassem formas de garantir a segurança e a paz. Concluiu com um apelo à comunidade internacional para que compreenda o que está a acontecer e “formule algo que as partes possam aceitar”.