Torcendo pelo Brasil fora do Brasil: O solitário torcedor forasteiro

Torcendo pelo Brasil fora do Brasil: O solitário torcedor forasteiro


(Ivan Pacheco/VEJA.COM/VEJA)

Só eu e o Ederson éramos palmeirenses na minha turma do ensino fundamental. Torcer, naqueles tempos em que vacas magras e emaciadas pastavam no Parque Antártica, era um sofrimento vivido em estado de constante semi-solidão e perpetuado por piadas cruéis daqueles que eram a maioria – os torcedores corintianos e paulistas.

Lembrei disso há poucos dias, quando os grupos de WhatsApp e as redes sociais que costumamos frequentar em nosso lazer destrutivo só falavam de Rebeca Andrade, é ouro, viva o Brasil, música da Anitta, ziriguidum, hino retumbante, reverências e referências merecidas .

Assistir a um grande evento esportivo do outro lado do Atlântico é como ser um torcedor solitário de um time da escola. Faltam consonâncias e tangências. Existem restos incomuns. Nem o georreferenciamento se salva: se eu digitar “quadro de medalhas” no Google, é a Eslovênia que aparece em destaque, e não o Brasil-sil-sil-sil. (Para quem estiver interessado: enquanto escrevo isto, minha pátria eslava ocupa o 42º lugar, com uma única medalha de ouro – aliás, parabéns, judoca Andreja Leški!)

Se eu sair para a rua ninguém comenta as chances do Brasil no vôlei de praia ou se será possível ganhar mais uma medalha na marcha atlética. Ainda bem que trabalho em casa. Se eu me limitar a postagens e mensagens de amigos locais nas redes sociais, ninguém compartilhará memes que façam sentido para mim. Estou feliz por ter evitado esse negócio do Facebook e outras coisas por um tempo.

Há também o aspecto cultural, claro. Copa do Mundo, por exemplo. A maioria não dá a mínima. Mesmo quem liga, aliás, não entende a necessidade do brasileiro parar tudo no dia do jogo da seleção, fazer churrasco, comprar cerveja extra, reunir os amigos, trombetear, reclamar e amar Galvão, sofrer e até rir de 7 a 1 No ano retrasado, na última Copa do Mundo, tentei: reuni amigos eslovenos em minha casa para assistir alguns fracassos do roteiro nacional e ainda tomei o cuidado de sintonizar um streaming de mambembe com brasileiros narração.

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O locutor aqui simplesmente narra. Não torce nem distorce

No fundo, acho que ninguém entendeu nada – nem mesmo o cachorro-quente que servi, completo com ervilha, batata frita, molho de tomate e queijo ralado.

Na verdade, a narração é outro ponto. O locutor aqui simplesmente narra. Não torça. Também não distorce. Não vibra, não fica excitado. Sem suposições. Ele mantém o mesmo tom do começo ao fim, como se estivesse rezando uma missa em latim ou lendo um folheto de remédio para hipertensão. Emocionante assim. É por isso que os torcedores não gritam gol – no máximo, eles se levantam e batem palmas quase silenciosamente.

No campo do futebol, até campeonatos envolvendo o querido Palmeiras são complicados. Outro dia meu médico me fez a pergunta que todo mundo insiste em fazer em relação à minha cidadania brasileira: “você é bom no futebol?”; e eu respondi, como sempre acontece: “nada, uso óculos, só sou bom de assistir, de preferência com um copo gelado na mão”.

A verdade é que ultimamente nem sou mais bom em assistir.

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Não é apenas um oceano que me afasta dos jogos de quarta à noite ou de domingo à tarde. É a dificuldade de sintonizar em tempo real, é a perturbadora diferença de fuso horário. E é, principalmente, a sensação de que estou novamente na segunda série, tendo apenas o Ederson como interlocutor do meu alviverde.

Até os títulos são um pouco enfadonhos. Em 2018, eu estava vivendo minha primeira temporada no exterior e vi o campeão brasileiro Palmeiras no meu laptop. Naquele ano, não tínhamos nem TV em casa. Sensação estranha: não pude sair para comemorar e nem houve aquela segunda-feira seguinte em que o tema prevaleceria nos cafés de trabalho. (Para piorar a situação, um presidente recém-eleito participou da entrega da xícara, e a verdadeira água quente da bebida arruinou a glória da xícara.)

Nas poucas vezes que tenho vontade de passar a noite em frente à tela — geralmente porque meu time avançou para uma semifinal da Libertadores ou algo parecido — sinto aquela ansiedade invertida, com a certeza de que não haverá barulho de um fogo de artifício, sem gritos de ninguém. gol madrugador por conta do atraso na minha TV, nada de vizinhos do Corinthians xingando na janela ao lado.

A segunda série, neste caso, é um país inteiro. Esta Eslovénia onde ninguém parece interessado em discutir o gigantismo de Evair no Paulista de 1993, a divindade de Ademir para o desporto nacional ou o sucesso esmagador de Abel na sua colonização portuguesa do futebol brasileiro. Ninguém se lembra de nomes folclóricos como Gioino, Marco Osio, Adriano Chuva ou Rosembrick.

Ederson dessa vez é meu filho. Chico tem 10 anos e, contrariando todas as expectativas de um jejum transatlântico, nutre todos os dias sua paixão pelo Palmeiras.

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