Existem Beatrice famosas. A de Dante Alighieri, supostamente inspirada em Beatrice Portinari, filha de um banqueiro florentino do século XIII. Ela tem a do Chico Buarque e do Edu Lobo, “ela é jovem, é triste, é o contrário?” A música – uma das mais belas da MPB – faz parte da trilha sonora do musical O Grande Circo Místicolançado em 1983, baseado no poema surrealista do alagoano Jorge de Lima, de 1938. Chico já contou que ficou horas a fio enfiado sem que a letra saísse. A personagem original se chamava Agnes, da qual ele gostou, mas não tinha como fazer rimar. Aí ele veio com isso: “Sim, me leva para sempre, Beatriz/Ensina-me a não andar com os pés no chão/Para sempre é sempre por pouco”.
“E agora tem a Beatriz Souza”, diz Bia do judô, medalha de ouro na categoria acima de 78 quilos. A frase, que pode soar arrogante na boca de algumas pessoas, sai com a simplicidade de campeões improváveis, um sorriso aberto emoldurado por óculos para miopia e astigmatismo. No dia 2 de agosto, sexta-feira, ela acordou repentinamente e foi dormir campeã olímpica. Ao retornar à Vila dos Atletas foi celebrada como personagem de Dante, como figura buarciana. Festa, algazarra, a tradicional comemoração dos colegas para quem subiu ao pódio. Já era de madrugada quando a temperatura caiu e ela foi então para o quarto que dividia com a judoca Larissa Pimenta, que no dia 27 de julho havia conquistado o bronze na categoria até 52 quilos. Os dois posteriormente levariam mais um bronze, em equipes. É isso mesmo: naquele canto do prédio número 3 de Saint-Denis, estariam quatro medalhas olímpicas colocadas delicadamente em cima das malas.
Beatriz demorou a dormir – um pouco por causa do desconforto da cama de papelão e muito por causa do que havia acontecido com ela. E o que faz uma atleta de ouro quando se deita? Você sonha com o paraíso de Dante, canta Chico Buarque, faz uma viagem de volta à sua infância na cidade de Peruíbe, no litoral de São Paulo? Nada. “Continuei repassando as lutas em minha mente”, diz ela. Para sua treinadora no Clube Pinheiros, em São Paulo, a ex-judoca Maria Suelen Altheman – com quem chegou a lutar inúmeras vezes, em busca de uma vaga nas Olimpíadas –, Bia faz da dedicação um recurso inigualável. “A categoria peso pesado do judô é muito cerebral, exige concentração permanente, é um jogo de estratégia”, diz Maria Suelen. “A Bia fez uma Olimpíada muito inteligente.”
“EU IA ENCONTRAR UMA MANEIRA DE VENCER NA VIDA”
Na semifinal, a francesa Romane Dicko, muito querida pelos fãs, ganhou ainda mais carinho ao revelar que sofreu bullying por ser negra e grande. Ela entrou nas redes sociais, deu entrevistas e transformou a anatomia em um manifesto. “É a mesma coisa comigo”, diz o brasileiro. “O esporte me mostrou o quanto sou linda, o quanto meu corpo é importante, o quanto preciso amar meu corpo. Suelen uma vez me disse que o corpo é nosso instrumento de trabalho, e se não amássemos nosso corpo, quem o faria? Levei essa frase para minha vida.” E se ela não fosse judoca, campeã olímpica? Ela riu, e não aceitou a ideia de que estava apenas lutando para sobreviver, como tantos outros preconceitos como ela. “Eu ia encontrar uma forma de vencer na vida, com estudo. Faço administração de empresas, mas agora online – um dia me formo.”
Ela só para de sorrir – rindo, note-se – quando entra em um assunto que a tornou famosa, depois do título, ao falar para câmeras de televisão com os pais, no Brasil, pelo celular. “Foi para a vovó, é para a vovó, mãe.” A simplicidade da homenagem é um capítulo da beleza olímpica – das vencedoras das quais mal ouvíamos falar, e como nós, jornalistas, corríamos atrás de informações à medida que ela avançava na chave… A avó era Brecholina, a mãe da mãe, falecida aos 87 anos, dois meses antes dos Jogos de Paris. Ela caiu em casa e quebrou a cabeça do fêmur. No hospital, ela contraiu uma infecção. Beatriz puxa o fio do “foi para minha avó”, as três palavras inesquecíveis: “Ela era minha maior fã. Ela sempre me dizia: ‘bate em todo mundo aí’. Ela era uma mulher incrível. De origem portuguesa ou italiana, não tenho certeza agora. Ela sempre foi uma guerreira, meu avô morreu muito cedo. Ela se encarregou de tudo. Ela cuidava da casa, trabalhava, criava dois filhos muito legais, minha mãe, Solange, e meu tio, Alcides. Eu era a namoradinha da minha avó, a neta mais nova. Passei férias com ela em Santos, ela me levou para passear, víamos Sessão da Tarde e novelas”.
Agora que o Brasil a conhece – “é mentira, é comédia, é divino” – Beatriz desembarcou de França, depois de uma rápida viagem à Torre Eiffel e de selfies em frente à Mona Lisa, com uma preocupação, que partilha com o marido, ex-jogador de basquete e terapeuta esportivo, Daniel Souza. “Sou uma garota de shopping, gosto de passear… E agora, quem vai me reconhecer? Eu sei, vou me disfarçar. E rir.
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