BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Uma ala do STF (Supremo Tribunal Federal) calcula nos bastidores que a chance de o tribunal validar o projeto de lei Antiaborto por Estupro tramitando na Câmara dos Deputados é muito baixa, caso seja aprovado pelo Congresso Nacional.
Os ministros entendem que o texto tal como está é inconstitucional. A avaliação deles é que não há ambiente político para retomar o julgamento de descriminalização total do aborto nas primeiras 12 semanas de gravidez, mas que uma lei que restrinja as atuais possibilidades de interrupção da gravidez não seria endossada pelo Supremo Tribunal.
Em relação à PEC (proposta de emenda à Constituição) que inclui no texto constitucional a criminalização do porte e posse de todas as drogas, a leitura feita é que, independentemente da posição do Congresso, há espaço para uma decisão que diferencie os usuários e traficante de drogas em relação à maconha.
A reportagem ouviu dois ministros e dois assessores que trabalham diretamente com outros dois membros do tribunal.
Os desembargadores admitem nos bastidores que será necessário fazer uma equação política quanto ao momento adequado para esses julgamentos, caso as pautas avancem no Legislativo. Os processos orientados pela ex-presidente do STF Rosa Weber aumentaram as tensões com o Parlamento, e o objetivo atual é tentar manter uma relação harmoniosa com o Congresso.
Isso porque os movimentos de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) contra o Supremo no Congresso têm ganhado cada vez mais força.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o chefe da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), fizeram uma aliança específica com a ala bolsonarista da Câmara de olho nas eleições e na disputa interna pela presidência do Senado que culminou na aprovação de uma série de medidas que contradizem o STF.
Em novembro do ano passado, por exemplo, senadores aprovaram uma PEC que limita decisões individuais na Justiça.
Antes disso, em setembro de 2023, em votação rápida, aprovaram o projeto do chamado prazo de demarcação de terras indígenas, menos de uma semana depois de a tese ter sido derrubada em decisão judicial.
A droga PEC foi um fenômeno semelhante. Em abril deste ano, o Senado aprovou a proposta que criminaliza o porte e posse de drogas, o que foi visto como um contra-ataque ao julgamento do STF que poderia descriminalizar a maconha para uso pessoal.
Nesta semana, a matéria foi aprovada na CCJ da Câmara por 47 votos a favor e 17 contra. A tendência é que também tenha maioria no plenário da Câmara.
Caso isso se confirme, o texto será promulgado pelo próprio Congresso. Os ministros reconhecem que a votação é uma resposta ao julgamento em curso no Supremo. Contudo, entendem que a PEC Legislativa não impede a definição judicial da quantidade de maconha que caracteriza uso pessoal ou tráfico de drogas.
No caso do aborto, o movimento partiu de uma aliança do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com a ala bolsonarista da Câmara e apoio de parte do centrão.
Os deputados aprovaram a instituição do regime emergencial no projeto que impõe prazo de 22 semanas para a realização de qualquer procedimento de aborto, inclusive nas hipóteses atualmente aceitas no país.
Hoje, o procedimento só é permitido em três situações, que são gravidez resultante de estupro, risco à vida da mulher e anencefalia fetal. Os dois primeiros estão previstos no Código Penal de 1940 e o último foi permitido por decisão do STF em 2012. Para todos esses cenários, não há limite de idade gestacional para a realização do procedimento.
O projeto ganhou força depois que o ministro Alexandre de Moraes suspendeu uma resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) resolução que proibia a assistolia fetal, procedimento que consiste na injeção de produtos químicos no feto para evitar que ele seja retirado com sinais vitais.
O procedimento é recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e considerado pelos protocolos obstétricos nacionais e internacionais como a melhor prática de cuidado à mulher em casos de aborto legal acima de 20 semanas.
A resolução do CFM é de autoria de Raphael Câmara Parente, ex-secretário de saúde básica do governo Bolsonaro.
Moraes suspendeu a eficácia da medida e causou reação no Congresso. Os ministros do STF, porém, acreditam que a tendência é que a decisão de Moraes seja referendada. Os magistrados não veem ambiente para a retomada do julgamento em que Rosa Weber votou pela descriminalização do aborto em todos os casos.
Apesar disso, ele acredita que uma mudança nas regras para restringir ainda mais as chances de aborto também não tem chance de prosperar se o STF analisar o assunto.
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